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“Precisamos de desluandizar o nosso país”

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“E o céu mudou de cor”: o primeiro livro do jornalista Israel Campos, lançado no dia 16 Fevereiro em Portugal, pela editora Kacimbo, no Cine-Teatro Garrett, à margem do encontro literário Correntes D’Escritas 2023.

“Precisamos de desluandizar o nosso país”
Fotografia: Humberto Mouco

Foi lançado em Luanda, na terra natal do escritor, no dia 14 de Maio, três meses após o lançamento. Mas Israel Campos não parou por aí, viu a necessidade de fazer o romance circular noutros pontos do país.

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Ontem, 16 de Agosto, pelas 17 horas, a jornada teve “por enquanto” encerramento no Palácio de Ferro, com entradas livres, os leitores tiveram a oportunidade de ter uma tertúlia com o autor sob moderação de Tabitha Dorcas.

Israel Campos partilhou com a Revista Chocolate as experiências que tem adquirido com a tour em cada apresentação do livro, em diversos públicos.

CH: Jornalista de profissão e sempre teve paixão pela escrita. Ao tornar-se escritor, como é que gosta mais de ser tratado actualmente?

IC: Tenho muito gosto em continuar a ser tratado da mesma maneira que tenho sido há já alguns anos, como jornalista. Foi esta a profissão que me escolheu há quase 10 anos e que continuo a exercer com muito gosto. Penso até que a escrita surge em consequência de ser jornalista. Não sou muito dado a títulos. Sou apaixonado por histórias, ter o prazer de contá-las é um grande privilégio, seja no jornalismo, ou na ficção. E é isso que para mim realmente importa.

CH: Está a ser difícil enquadrar as duas personagens? Conte-nos um pouco.

IC: Não me parece que sejam duas personagens distintas. Elas coabitam saudavelmente.

CH:”E o céu mudou de cor”, lançado em Portugal, posteriormente apresentado Angola –  Luanda. Havendo necessidade de também ser levado a outros pontos do país, por que províncias passou até ao momento?

IC: O livro foi primeiro lançado num festival literário, as Correntes D’Escritas, na Póvoa do Varzim, no norte de Portugal, em Fevereiro deste ano. Depois, fizemos eventos em Lisboa, Leiria e Coimbra. Foi uma honra muito grande apresentar o livro aos leitores angolanos em Portugal e aos portugueses. Aqui em Angola já fizemos várias apresentações em Luanda (primeiro foi na livraria Kiela, de seguida a Biblioteca 10Padronizada, casa de Cultura do Rangel) e depois no Huambo (no Instituto Superior Sol nascente), Namibe (na Academia Mais valor) e Benguela (no Museu Nacional de Arqueologia). Temos uma agenda de expandir as apresentações para mais outros pontos do nosso país, porque acreditamos que todos os angolanos merecem ter acesso aos livros.

CH:Como tem sido este percurso?

IC: Tem sido um percurso bastante enriquecedor. Por um lado, tenho tido a oportunidade de expandir o alcance do livro, por outro, o privilégio de aprender cada vez mais sobre o nosso país e as distintas realidades que existem nesta nossa imensa terra. Há muita beleza, mas há também muita desigualdade. Esta jornada tem me permitido observar e falar com pessoas, ganhando cada vez mais sensibilidade sobre a condição de vida de milhares de angolanos. Então, tem sido também um percurso de muito aprendizado. Precisamos ‘desluandizar’ o nosso país!

CH: Dos lugares por onde teve a oportunidade de passar, tem algum favorito? Qual e por quê?

IC: É uma pergunta difícil. Passámos por muitos lugares incríveis. Mas não posso esconder que fiquei particularmente impressionado com os eventos que fizemos no Huambo e em Benguela. Vi nestes dois sítios, em particular, uma juventude muito interventiva e ansiosa por mudança social urgente. E isso me renova muito a esperança numa Angola menos desigual e com maiores oportunidades para todos e todas.

CH: Ao embarcar nesta aventura “de andar por Angola para apresentar o livro”, tem encarado dificuldades?

IC: Sim, temos encarado vários desafios. A falta de uma estrutura nacional que se encarrega da distribuição dos livros, como uma livraria com cobertura nacional, ou assim, é um dos principais desafios que temos enfrentado a nível logístico. Ainda não é fácil enviar livros de uma província para a outra. As editoras têm de ficar reféns das transportadoras locais, que nem sempre operam com a eficiência que se impõe.

Depois, apesar de todos os custos logísticos associados, os preços dos livros precisam de ser realistas, atendendo ao contexto social das províncias/regiões que visitamos. É quase um milagre fazer tudo acontecer. Felizmente temos contado com a colaboração de parceiros locais que nos têm ajudado a co-organizar estes eventos.

Não tem sido fácil, mas vamos continuar a fazer porque consideramos imperativa a democratização do acesso ao livro. Penso até que se trata de uma questão de Estado, que deveria merecer mais atenção das nossas instituições públicas com essa vocação.

CH:O livro tem tido feedback positivo dos leitores?

IC: É difícil determinar a qualidade geral do feedback dos leitores. Para além das mensagens de leitores que temos recebido e de algumas resenhas nas redes sociais, temos tido a felicidade de ver leitores voltarem aos nossos eventos para debater sobre os vários aspectos do livro, após concluídas as suas leituras. Acho que isto é o mais importante e gratificante. Que as questões que o livro coloca suscitem uma discussão pública, sobre pontos negativos, ou positivos.

CH: Dos comentários recebidos, qual é o denominador comum?

IC: Um aspecto que tenho ouvido muito, tanto em Angola como em Portugal, é a sugestão de que este livro é uma crítica social e política à realidade actual em Angola. Eu não disputo esta opinião. Acho que quem for ler o livro entenderá o porquê. Mas não é só um livro sobre isso. Diria que há no livro histórias de afectos também.

CH: Tem uma data prevista para o lançamento da próxima obra?

IC: Nem pensar. Escrever um livro é um processo longo, emotivo, às vezes de muita alegria, outras vezes (maioria) de muita frustração. Não é uma competição, por isso não me sinto pressionado a escrever um segundo. Acho que os livros precisam do ar do tempo para amadurecerem, seja nas estantes ou nas leituras diárias.

CH: Desta vez, será lançada cá, certo?

Israel Campos: Vamos ver…

CH: Sendo escritor, acreditamos que tenha referências na literatura. Quem são?

IC: Não tenho uma única referência. Sou um leitor versátil. E então bebo de várias ‘fontes’. Da literatura angolana, africana, brasileira, portuguesa à mundial. Gosto de ler o Manuel Rui Monteiro, por exemplo, da mesma forma que tenho gostado imenso de ler o brasileiro Jefferson Tenório.

Perfil

Israel Campos é licenciado em Jornalismo pela City University of London, é actualmente mestrando em Comunicação Estratégica e Liderança, na Universidade Católica Portuguesa. Começou a sua carreira como locutor de programas infantis na Rádio Nacional de Angola, aos 12 anos de idade.

Actualmente, é jornalista freelancer para o serviço em português da Voz da América (VOA) e para o serviço mundial da British Broadcasting Corporation (BBC), cobrindo assuntos como política angolana, ambiente e sociedade.

Em 2021, Israel foi considerado uma das 100 personalidades negras mais influentes da lusofonia (Bantu Men). Entre as demais premiações que acumula, foi vencedor do prémio “EU GCCA+Youth Awards for the best climate storytelling”, da União Europeia, em 2021 – e nomeado finalista dos prémios “Free Press Award”, em 2022 e para os prémios “Amnesty Media Award”, no mesmo ano. Israel foi homenageado este ano pelo seu contributo jornalístico e juvenil na Gala Afrodescendentes em Zurique, Suíça.

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