“Currículos são mapas. Mas mapas não mostram as cicatrizes da viagem.”
— David S. Hall, O Currículo Vencedor
Entramos no mercado de trabalho como quem entra numa sala de exames, com papel na mão, notas no bolso e a expectativa de que tudo o que somos caiba numa folha A4 bem diagramada. Mas, o que fazer quando o teu maior aprendizado não vem da universidade, mas do luto que enfrentaste em silêncio? Quando a tua soft skill mais forte nasceu num quarto escuro de ansiedade, e não num workshop motivacional?

É hora de dizer o óbvio que poucos têm coragem de escrever, diplomas importam, mas a capacidade de continuar, depois de ser rejeitado, subestimado ou invisibilizado, importa ainda mais.
O CV não conta tudo, mas não precisa contar, tu deves saber o que ele esconde. No seu livro O Currículo Vencedor, David S. Hall lembra que o currículo é “a tua primeira impressão num mundo onde segundos definem destinos”, e, por isso, acabamos a resumir tudo aquilo que somos em tópicos polidos: cursos, prêmios, idiomas, mas o teu currículo não mostra que tu foste rejeitado 9 vezes antes de conseguires aquele estágio, não diz que estudavas à noite com o estômago vazio ou que foste a única mulher negra numa sala de TI cheia de piadas veladas. Essas histórias não cabem no CV, entretanto, constroem a tua capacidade de continuar.
A educação formal ensina técnicas, a vida, ensina a continuar, Peter Schuck, em A Mentira da Educação, provoca: “O mito de que uma formação tradicional garante o sucesso é o que mais atrasa as reformas educacionais, ”o que ele denuncia é simples, há uma crença excessiva de que um diploma, por si só, resolve tudo, porém, o mercado está cheio de formados que não sabem ouvir, trabalhar em equipa, ter iniciativa ou lidar com pressão. É aí que entra o valor silencioso das soft skills, que Juliana C. P. Pereira define em seu livro Soft Skills: As Habilidades Comportamentais que Fazem a Diferença, como “a ponte entre o conhecimento técnico e a eficácia no mundo real”, autora defende que saber comunicar, adaptar-se, liderar com empatia e persistir são diferenciais muitas vezes mais relevantes que uma pós-graduação. Continuar quando tudo grita ‘desiste’, eis a verdadeira qualificação.
O que nos torna valiosos num ambiente profissional não é apenas saber “o que fazer”, mas “como continuar quando tudo parece desmoronar”, essa habilidade rara de levantar após uma perda, de reaprender depois de uma demissão, de respirar fundo diante da humilhação, não se ensina na escola, entretanto, ela molda líderes, empreendedores, professores e colaboradores que marcam a diferença.
Então, se estás a procurar emprego, não te envergonhes dos espaços em branco no teu CV, eles não são falhas: são capítulos que não couberam na folha, mas que carregas na pele, se já estás a trabalhar, não subestimes o colega que não tem MBA, mas tem uma história de superação, às vezes, ele já passou por batalhas que te dariam um curso inteiro de maturidade.
Um novo olhar sobre o valor profissional, neste mundo onde tudo parece quantificável, desde o número de cursos ao número de conexões no LinkedIn, talvez o maior valor de um profissional não esteja no que ele coleciona, mas no que ele suporta sem quebrar, na forma como transforma dor em força, porque no fim, o que nos mantém não são os diplomas na parede, mas a coragem de continuar, mesmo quando ninguém está a aplaudir.
Texto: Wínia Silvana